Há uma promessa divina de que, com o avanço da maldade, o amor de muitos esfriará (Mateus 24.12). Todavia, não se espera que, dentre esses "muitos", estejam os santos, visto ser o amor uma das expressões do fruto do Espírito (Gálatas 5.22). Como a própria expressão indica, esse fruto é um efeito natural da presença e atuação do Deus Espírito Santo. Então, poderíamos tristemente dizer, ou ao menos hastear uma interrogação, que não faz parte da família cristã aquele que não ama. O apóstolo João deixou bem claro que "aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor." (1 João 4.8). Dito tudo isso, minha reflexão, neste texto, vai ter como base os choros de Jesus como expressão de seu amor, para averiguarmos em que sentido temos imitado o capitão de nossa salvação. Conquanto os sentimentos e expressões de compaixão sejam apenas manifestações do amor, e não propriamente o amor, me valerei dessas afeições para aferir minimamente o nosso amor cristão.
1) Jesus chorou. (João 11.35)
Em um dos menores versículos da Bíblia se encontra uma das maiores expressões de amor. Jesus chorou, pois, como um homem completo na integralidade de seu ser, sentia o sofrimento dos seus mais próximos. A ocasião marcava a morte de seu amigo Lázaro, e, mesmo sabendo que iria ressuscitá-lo em breve, se comoveu diante do sofrimento de Marta e Maria:
"Quando Maria chegou ao lugar onde estava Jesus, ao vê-lo, lançou-se-lhe aos pés, dizendo: Senhor, se estiveras aqui, meu irmão não teria morrido. Jesus, vendo-a chorar, e bem assim os judeus que a acompanhavam, agitou-se no espírito e comoveu-se. E perguntou: Onde o sepultastes? Eles lhe responderam: Senhor, vem e vê! Jesus chorou. Então, disseram os judeus: Vede quanto o amava." (João 11.34-36)
A constatação final dos judeus é maravilhosa: "Vede quanto o amava.". A comprovação pública do amor do Senhor veio através de sua compaixão evidente em seu choro. Diz a Bíblia que houve uma agitação comotiva no espírito de Jesus. Seu interior ardeu de misericórdia e o resultado foram as lágrimas de compaixão.
2) Vendo Jerusalém, Jesus chorou. (Lucas 19.41)
Em um jumentinho, Jesus estava indo em direção a Jerusalém. A sua crucificação se aproximava, bem como as traições de seus discípulos e o enfrentamento da ira de seu Pai. Todavia, quando estava entrando em Jerusalém, não foi o aproximar de seu derradeiro sofrimento na cruz que o fez chorar. Cristo viu, com o olhos humanos, mas através das lentes da graça, a dor daquele povo. Jesus literalmente chorou:
"Quando ia chegando, vendo a cidade, chorou e dizia: Ah! Se conheceras por ti mesma, ainda hoje, o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos. Pois sobre ti virão dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados, te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste a oportunidade da tua visitação." (Lucas 19.41-44)
No texto de Mateus 23.37, não aparece que Jesus chorou, mas é possível perceber a mesma comoção diante do estado degradante de Jerusalém :
"Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!"
Ah, Jerusalém, Jerusalém, o que fizeste para provocar profunda comoção em Cristo? Creio piamente que Jesus chorou não apenas porque a destruição desta cidade estava próxima, mas também porque ele enxergou a miséria que o pecado causa. Jesus viu a opressão do pecado e a dor de uma cidade, e se entristeceu. Ah, Jerusalém... Quantas vezes um chamado ao arrependimento lhe foi feito? Oh, Jerusalém que me lê, até quando não se voltará a Cristo?
3) O choro do Getsêmani (Hebreus 5.7)
Já sabemos que, em agonia, suando gotas de sangue (Lucas 22.44), Jesus passou pelo Getsêmani momentos antes da crucificação. Não nos é informado, explicitamente, que Cristo chorou, mas, diante de todo contexto, não é nem um pouco difícil de imaginar que isso tenha ocorrido. Por isso, creio que essa curta menção na carta aos Hebreus faça referência a um choro de Jesus naquela difícil ocasião:
"Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade," (Hebreus 5.7)
Engana-se quem pensa que a agonia de Cristo se deveu ao medo da morte. Jamais o Senhor de nossa salvação se entregaria ao pavor da crucificação, enquanto muitos outros discípulos se lançariam ao mesmo estilo de morte, em regozijo e em paz, apenas porque estavam imitando também seu Senhor. Conforme indicado pelo próprio Cristo, sua agonia era referente ao Cálice da ira de seu Pai que estava se aproximando. Seu maior sofrimento na cruz nunca foi retratado por filme algum, pois dificilmente se coreografa o Deus Pai esmagando em ira Jesus Cristo. Portanto, seu lamento e agonia tinham como pano de fundo a punição do pecado que ele estava assumindo. Era este maldito pecado que estava, mais uma vez, fazendo Cristo chorar. Com lágrimas celestiais descendo pelo rosto de Jesus, deveríamos entender que cada pecado exige uma lágrima.
É aqui que entra meu ponto de comparação com os cristãos a fim de concluirmos essa reflexão. Farei algumas perguntas e desejo que responda a si mesmo com bastante sinceridade:
1) Você sente a dor de Deus diante do pecado?
2) Sua alma arde em agonia quando o pecado te dá uma rasteira?
3) Quando um irmão peca e cai, seu lamento é semelhante ao de Cristo diante de Jerusalém?
4) Você chora com os que choram?
5) Você consegue olhar para este mundo com as lentes da misericórdia e se estremecer como que está na pele de Cristo?
Faço essas perguntas porque, infelizmente, não são poucos os cristãos atualmente que riem dos que caem, e choram quando um santo é abençoado. É a inversão do mandamento bíblico, que me fez achar que ou a maldade entorpeceu o amor ou é cada vez mais raro sentir a dor de Deus diante do pecado. Deus continua olhando para a terra e vendo o estado caótico causado pelo pecado, ao mesmo tempo em que continua a existir, na Escritura, um radical chamado a imitarmos a Deus. Que tal, caro cristão, se ainda não tem imitado o Cristo que chorou em lamento diante das mazelas do pecado, começar a ser um exímio imitador dAquele que chorou, indo para a Cruz, para que você pudesse sorrir com a graça da salvação?
Rodrigo Caeté
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