Este
texto é uma análise da música “Ninguém explica Deus”, da banda Preto no Branco.
Esta
música tem feito sucesso no meio gospel,
e, como a maior parte da música evangélica atualmente, também tem influenciado bastante
na teologia nacional. A questão que se levanta é: será que a teologia pregada (Lutero dizia que a música é a
teologia cantada) – direta ou indiretamente – por meio dela está correta? Ela
está explicando acertadamente sobre Deus?
Sendo
sincero com os autores da letra, dá para entender o que eles estavam querendo
dizer com esta música. Penso que a ideia é que, em última análise, nenhum ser
finito e criado consegue por força própria compreender e explicar o SENHOR na Sua totalidade.
Isso é um fato indiscutível!
A questão
é que entre o que se quer dizer e o que se diz pode haver um abismo gigantesco,
e é aí que reside o problema! Em suma, a música congregacional existe para que
todos, tanto a pessoa simples e menos culta, quanto a que tem um nível estudo mais
elevado, possam cantar e entender racionalmente o que se está cantando. Porém, infelizmente,
tem existido muita música um tanto quanto ambígua, podendo gerar assim muito
mal entendido. E, considerando que a música evangélica brasileira tem
desempenhado um papel fundamental na teologia, essa ambiguidade estrutural
torna-se um prato cheio para heresias.
Não
é sem razão, portanto, que tem surgido dois tipos de críticos diante dessa música:
1) Há
aqueles que dizem que, de fato, “ a letra mata, mas o espírito vivifica”; e que
a teologia tem mesmo acabado com a fé de muitos de nossos jovens que frequentam
seminário; tem também acabado com a espiritualidade; e outras coisas mais que vão ao
encontro de um espírito anti-intelectual gospel.
2) Há
também aqueles que, fervorosamente, defendem o estudo teológico, não para a
compreensão total de Deus, mas como uma forma de se aproximar mais do SENHOR em
santificação. Estes apontam que quanto mais se conhece a Deus nas Escrituras,
mais há razão para a santificação prática.
Se
considerarmos, então, que o que Paulo afirma em Colossenses 3.16 é que uma
das formas de instruir e aconselhar mutuamente é por meio do louvor, dos salmos, hinos e cânticos espirituais, teremos um problema com músicas nem
pretas nem brancas, porém ambíguas.
Comecemos
a análise:
O
título em si já é autorrefutatório – ninguém explica Deus. Quem não entende a
ideia dos autores, apenas pelo título compreende que Deus não se explica. O
grande problema é que quando se diz que ninguém explica Deus isso já se torna uma
explicação sobre Deus. A explicação sobre Deus é que Deus não é explicado. Isso gera, portanto, um argumento circular. É
mesma coisa que dizer que não há verdade absoluta. Quem afirma isso já
parte do princípio de que há uma verdade absoluta. E qual é a verdade absoluta
dessa pessoa? A de que não há verdade absoluta (argumento circular).
Outro
problema é que, se pelo título alguém interpreta literalmente que ninguém
explica Deus, torna-se absolutamente nulo ouvir todos os domingos os sermões
dos pastores, visto que eles estão tentando explicar Deus. Não apenas isso, mas
se um leigo ou novo convertido entende que a Bíblia é uma explicação sobre Deus
por meio de homens, ele pode concluir também que a Escritura não merece atenção,
assim como os pastores. Dessa forma, bastam as nossas experiências com Deus, já que
elas estão no campo da fé e não no da razão.
Nada
é igual ao Seu redor
Tudo
se faz no Seu olhar
Todo
o universo se formou no Seu falar
Que “Todo
universo se formou no Seu falar” é uma verdade indiscutível. É maravilhoso
saber que o SENHOR criou todas as coisas falando. Imagina o que Ele pode fazer hoje por meio de
sua Palavra! O ponto ambíguo nesta
primeira estrofe é outra frase “Tudo se faz no seu olhar”.
Em
primeiro lugar, precisamos saber que a licença poética precisa ter limite
quando a questão é o louvor eclesiástico. Conforme já dito aqui, nem todos vão
entender, e o louvor a Deus tem que ser algo simples e racional.
Deste
verso - “Tudo se faz no seu olhar” – depreende-se duas coisas: 1) ou que se
contradiz o ensino Bíblico de que as coisas foram criadas não somente por sua
palavra, mas também por seu olhar. Ou seja, “todo universo se formou no
Seu falar” e “tudo se fez no seu olhar”. Não há como negar que a contração no
(em +o) indica o meio pelo qual as coisas foram criadas e formadas. 2) ou
podemos entender que não há contradição. Na verdade, Deus criou sim todas as
coisas por meio de seu falar, mas essas coisas criadas estiveram debaixo de seu
olhar. “ou seja, quando as coisas foram feitas pela palavra de Deus, o Senhor
olhava tudo, Deus observava cada árvore que nascia ao seu comando.”
Percebem
o problema? Independente de a motivação dos autores ser honesta e partir de uma
cosmovisão bíblica correta, isso não está claro aqui. A música precisa estar
isenta de ambiguidade interpretativa.
Teologia
pra explicar ou big bang pra disfarçar
Pode
alguém até duvidar sei que há um Deus a me guardar
Seguindo
com a análise, este trecho apresenta no mínimo três leituras: 1) Ele pode estar apenas delimitando os campos de atuação, não necessariamente fazendo juízo de valor. Enquanto a teologia lida com a explicação de
Deus, a ciência, com sua teoria do big bang, tenta de alguma forma ocultar a
Deus. 2) Pode ser uma depreciação das esferas de atuação: a teologia (tenta)
explicar a Deus, enquanto que a ciência (tenta) escondê-Lo. Porém o SENHOR está
acima tanto de um quanto de outro. Nem um nem outro explicam Deus. 3) finalmente, podemos ver aqui também uma
valorização da teologia em detrimento da ciência. Isto é, enquanto a teologia
explica a Deus, a ciência tenta abafar isso.
O
problema é que no fim das contas nem eu mesmo consigo ver o que é mais correto.
É tanta salada poética que fica difícil entender em que ponto estou adorando a
Deus. Obviamente que quando alguém está cantando em louvor ao SENHOR, essa pessoa
não presta atenção se se está usando a interpretação de 1, de 2 ou de 3. Acaba
que ela canta ou por cantar ou de acordo com sua própria hermenêutica.
Próxima
estrofe:
E eu
tão pequeno e frágil querendo Sua atenção
No
silêncio encontro resposta certa então
Dono
de toda ciência, sabedoria e poder
Oh
dá-me de beber da água da fonte da vida
Este
talvez seja o melhor trecho em virtude de ser o mais claro. Ele fala da
grandeza de Deus e da nossa fragilidade; mostra uma das formas de se encontrar Deus:
no silêncio; aponta também para a Soberania do Senhor, sendo Dono da ciência, da
sabedoria e do poder; e termina mostrando que Ele é a fonte de toda vida.
Simples, fácil de entender e correto!
Próxima:
Antes
que o haja houvesse Ele já era Deus
Se
revelou ao seus do crente ao ateu (do gentio ao judeu)
Ninguém
explica Deus
Aqui
a ambiguidade volta novamente. A estrofe até se inicia de modo tremendo: DEUS SEMPRE
EXISTIU, mesmo antes que o haja houvesse. Vejamos, porém, as duas possíveis interpretações:
1) Ele novamente volta a dizer que ninguém explica a Deus, mas ao mesmo tempo
diz que Ele se revelou aos seus. Uma pergunta pode ser feita aqui: quando Deus
se revelou aos seus, Ele se revelou se explicando sem dar aos seus a explicação?
(nem eu entendi isso). Em princípio, é fato que Deus explica Deus. Ele é conhecido
à medida que se revela. Nesse sentido, portanto, os seus explicam a Deus na
medida em que Deus se revela e se explica a eles. 2) Porém, não é isso que esse
trecho está dizendo. Em nenhum momento ele diz que Deus não se explica através
de Sua revelação. As próprias citações bíblicas diretas e indiretas nesta
música já evidenciam que Deus se explica em Sua própria revelação. Neste ponto,
portanto, “temos duas opções, ou o autor é um esquizofrênico ou ao escrever
essa canção, não cometeu o erro que é apontado no ponto 1. A segunda opção,
neste caso, é a mais provável.
Finalmente,
o último trecho diz o seguinte:
Ninguém
explica, ninguém explica Deus
E se
duvida ou se acredita
Ninguém
explica, ninguém explica Deus
Pra
encerrar, nada melhor que mais uma ambiguidade. 1) Aqui é possível concluir
taxativamente o ponto do autor. Novamente ele repete a máxima “ninguém explica
Deus”, e, além disso, deixa claro seu parecer na frase seguinte “e se duvida ou se acredita”.
Duvidar ou acreditar é o contraponto da racionalização, e da fé com base na revelação
explicada. A fé pressupõe o Logos, a Razão (João 1), e isso indica que nossa fé
não é cega e irracional. 2) Não é isso que está sendo dito. Está claro em todo
texto que a razão não é o meio pelo qual o ser humano conhece a Deus. Deus é
incompreensível para a mente humana, a não ser que Ele se revele. O ponto evidente aqui é que ninguém conhece a Deus em Sua totalidade!
E agora? Quem está certo? É complicado louvar congregacionalmente a Deus quando há a possibilidade, ainda que remota às vezes, de duas ou mais interpretações.
Antes
de finalizar, cabe aqui uma consideração. Olhando todo o contexto da música, dá
pra perceber que o que ela está dizendo é algo bem verdadeiro: que ninguém
conhece a Deus em Sua totalidade! Isso ninguém discute. O que se debate é se
isso está claro para o cristão simples. A minha conclusão é que em vista de
algumas ambiguidades, essa não seria uma boa canção para o momento eclesiástico.
Não é por conta de haver heresia, porque interpretando corretamente não há
(isso se eu também interpretei corretamente o que o autor está querendo dizer
(rs)), mas para evitar as heresias decorrentes das ambiguidades.
O
sim sim e o não não textual é fugir das ambiguidades quando o assunto é o
louvor na igreja e colocar tudo preto no branco.
“os teus decretos são motivo dos meus cânticos” (Salmo 119.54)
Rodrigo Caeté
Segue abaixo uma paródia brilhante dessa música. Confiram!
Alguem ja disse: "teologia se faz a lapis".
ResponderExcluirTudo se explica em Deus.
Uma pergunta! Quando nos não conhecemos algo nos no ficamos curiosos pra saber o que é! Mais quando está sendo revelado aquilo que não conhecemos no ficamos sientes do que seja? A gora explica a soberania de Deus aquilo que ele já mais revelou ao homem é bem diferente! Quem nus da a compreencao de Deus é a própria palavra e o espirito santo para nos fazer entende Deus! Conhecer deus! A bíblia nos ensina quem é Deus é explica Deus! Mais o segredo de Deus só pertence a ele
ResponderExcluirVocê tem o vídeo? O You tube excluíu.?
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