Pular para o conteúdo principal

Espírito Pairador: a maravilhosa obra de recriação

 

Eu tenho quase certeza de que você nunca ouviu falar sobre esse tal Espírito Pairador, pelo menos não com essa expressão – pairar. Normalmente, nós ouvimos sobre o Espírito SANTO, Espírito do SENHOR, Espírito de CRISTO ou Espírito de SANTIDADE, mas nunca sobre Espírito PAIRADOR. Ora, o que é isso? 

Sei que você está curioso para saber de onde eu tirei esta palavra, mas antes de prosseguir, quero fazer uma importante consideração, já que trataremos um pouco sobre um assunto tão complexo como trindade. Pisaremos em terreno sagrado, e é necessário tirarmos a sandália do orgulho para reconhecermos nossa limitação neste assunto. 

Geralmente, quando nos referimos às três pessoas da trindade, usamos uma forma didática de numerá-las em primeira, segunda e terceira, da forma como segue abaixo: 

1ª pessoa – Deus Pai
2ª pessoa – Deus Filho
3ª pessoa – Deus Espírito Santo 

Existe algum problema nisso? Dependendo do entendimento dessa classificação, sim. Em primeiro lugar, é bom que se saiba que essa forma de numerar a trindade surgiu a partir de uma heresia chamada macedonianismo. Este senhor, Macedônio, não acreditava que o Espírito Santo era Deus, bem como também cria que Jesus era eternamente inferior e subordinado essencialmente ao Pai. Foi a partir desse entendimento a respeito das três pessoas da trindade que Macedônio decidiu numerá-las como uma forma de mostrar a hierarquia entre elas. 

Contudo, a nossa declaração de fé deve ser a de que tanto o Pai, quanto o Espírito, quanto o Filho são um único Deus, tendo a mesma essência, mas sendo pessoas distintas. Não podemos crer em hierarquia na trindade, mas negar qualquer tipo de subordinação imanente. Portanto, embora seja muito comum na nossa linguagem, talvez seja melhor limitarmos a utilização dessa didática da enumeração, principalmente se tivermos tratando com quem ainda não entende a relação entre a trindade. 

Bagunça Santa 

Os autores do Novo Testamente não pensavam de forma numérica, e nem falavam sempre nessa ordem – Pai, Filho, Espírito Santo. Pelo contrário, pois, fazendo uma leitura mais cuidadosa, encontramos, por assim dizer, uma bagunça santa na forma como os autores falavam da trindade. Veja abaixo alguns exemplos de como as ordens eram diversas: 

a) Mateus 28.19 – Pai, Filho, Espírito
b) 1ª Coríntios 12.4-6 – Espírito, Jesus, Pai
c) 2ª Coríntios 13.13 – Jesus, Pai, Espírito
d) Filipenses 3.3 – Pai, Espírito, Jesus
e) Judas 20-21 – Espírito, Pai, Jesus
f) 1ª Pedro 1.2 – Pai, Espírito, Jesus 

Qual é o ponto nessa santa bagunça de citação? É que na cabeça dos autores bíblicos tanto faz a ordem, já que os três são Deus na mesma essência. E talvez aqui nós pequemos bastante, pois dificilmente adoramos as três pessoas da trindade da mesma forma. Ora valorizamos um, ora super exaltamos outro, mas raramente adoramos de verdade ao Deus Trindade. Isso pode ser um problema sério? Creio que sim. 

Idolatria 

Isso pode ser mais sério do que imaginamos, porque, por trás de nossa forma errada de enxergarmos a trindade, pode estar escondido o pecado da idolatria. Veja o que diz, como exemplo, Êxodo 20.3: 

“não terás outros deuses diante de mim”. 

Qual é a questão aqui? O nosso Deus é Jesus, Espírito e Pai. Se adoramos mais a um que a outro, esse ser adorado é outro deus. O ponto é que podemos facilmente adorar a outro deus quando enfatizamos mais uma pessoa da trindade que outra. Ou adoramos da mesma forma as três pessoas ou não adoramos nenhuma. Repetindo: o nosso Deus é trindade, Espírito, Pai e Jesus. Esse é seu nome. Qualquer deslize na ênfase redunda em idolatria, pois criamos outro Deus. Dito tudo isso, vamos ao Espírito Pairador. 

O ministério inicial do Espírito Santo: PAIRAR 

Diante das considerações iniciais, podemos declarar que as três pessoas da trindade fazem as mesmas obras (embora na economia da salvação haja diferenças, mas isso é assunto para outro texto). Um exemplo, então, que eu gostaria de destacar, é o da criação. Isso porque, naturalmente, atribuímos mais a Deus Pai a obra de criação, e achamos que Jesus e o Espírito Santo pouco ou nada têm a ver com isso. Ledo engano. O que veremos nos versos a seguir é Pai, Filho e Espírito trabalhando juntos na obra de criação. 

Gênesis 1.1: “No princípio Deus criou os céus e a terra” 

Já é sabido de muitos que “Deus”, neste verso, – Elohim – tem sua terminação morfológica no plural, o que equivale a tradução “Deuses”. Quanto a isso, por inferência, nós cristãos protestantes cremos que isso é uma alusão ao Deus Trindade. Em outras palavras, “No princípio Deus Pai, Filho e Espírito Santo criou os céus e a terra.” 

Mas se isso não te convence, não tem problema, pois o apóstolo Paulo diz em Colossenses 1. 16-17 que tudo foi criado por ele [Jesus], por meio dele e para ele. Ou seja, no mínimo devemos assumir que Jesus também é criador com o Pai. E quanto ao Espírito Santo? 

Gênesis 1.2: “A terra era sem forma e vazia, e havia trevas sobre a face do abismo, MAS o ESPÍRITO de Deus PAIRAVA...” 

Preste atenção nas ênfases que eu acrescentei. A terra estava inacabada, sem forma e vazia. Mas o MAS surge para mostrar que o ESPÍRITO daria um jeito nisso. O que ele iria fazer? PAIRAR! 

Este verso nos apresenta um Deus Trindade agindo harmoniosamente. É como se cada uma pessoa da trindade fosse complementando a obra do outro por meio de uma comunhão amorosa extraordinária. Jesus e Pai não fizeram a terra sem forma e vazia à toa, mas para que o Espírito viesse pairar, finalizando com a cereja do bolo. 

Afinal de contas, o que é pairar? O que o Espírito Santo estava fazendo especificamente? Por conta de todo contexto já apresentado, creio que o leitor já tenha uma noção. Se a terra estava sem forma e vazia e foi dado ao Espírito o ministério de pairar, sua atuação maravilhosa foi de dar forma a terra e enchê-la de plenitude. Em outras palavras, o Espírito é chamado, inicialmente, para trazer ordem e forma às coisas criadas, e trazer plenitude ao vazio da massa original criada. 

Agora que você já sabe que o Espírito também paira, permita-me fazer uma aplicação pastoral e indicar por que esse foi o ministério do Espírito. Pense na sua vida antes de ser cristão ou na vida de alguém não cristã. Normalmente, as pessoas não cristãs olham para si mesmas, em algum momento da vida, e declaram que a vida delas não faz sentido; que sente um grande vazio existencial. É como se ela se comparasse, sem perceber, com a obra inicial “sem forma e vazia”. 

Quando, então, o Espírito Pairador decide regenerar o coração dessa pessoa, ele vai fazer aquilo que mais sabe fazer, que é pairar: pegar a vida vazia e encher de plenitude, de Si mesmo, e pegar o desforme e sem sentido e dar forma e direção. Pronto: a pessoa foi pairada pelo Espírito. Agora há sentido e plenitude em sua vida. 

O ponto é que assim como o Espírito estava envolvido com a obra de criação no início, da mesma forma, ele está envolvido com a obra de recriação no novo nascimento da pessoa. Que fantástico isso! É uma graça superabundante sobre os eleitos. Dito de outra forma, quando somos convertidos, podemos dizer que o Espírito pairou sobre nós e nos recriou. Oh graça da regeneração. 

Usando a linguagem de Paulo, “se alguém está em Cristo, é nova criatura (uma nova criação, recriado a partir do caos – vida de pecado); as coisas velhas (sem forma e vazia) já passaram, e surgiram coisas novas.” (2ª Coríntios 5.17) 

Que belo ministério do Espírito! E que bela criação e recriação! Te louvamos por isso Deus Espírito, Deus Jesus e Deus Pai! Te adoramos Deus Trindade! Que o Espírito continue pairando sobre as vidas "sem forma e vazias". Amém! 

Rodrigo Caeté

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ninguém explica Deus? Uma análise "preto no branco"

Este texto é uma análise da música “Ninguém explica Deus”, da banda Preto no Branco. Esta música tem feito sucesso no meio gospel , e, como a maior parte da música evangélica atualmente, também tem influenciado bastante na teologia nacional. A questão que se levanta é: será que a teologia pregada (Lutero dizia que a música é a teologia cantada) – direta ou indiretamente – por meio dela está correta? Ela está explicando  acertadamente sobre Deus? Sendo sincero com os autores da letra, dá para entender o que eles estavam querendo dizer com esta música. Penso que a ideia é que, em última análise, nenhum ser finito e criado consegue por força própria c ompreender e explicar o SENHOR na Sua totalidade. Isso é um fato indiscutível! A questão é que entre o que se quer dizer e o que se diz pode haver um abismo gigantesco, e é aí que reside o problema! Em suma, a música congregacional existe para que todos, tanto a pessoa simples e menos culta, quanto a que tem um nível est

Santificação Psicológica e Rituais Evangélicos

No nosso arraial evangélico, sobretudo em momentos de retiro espiritual e encontros de casais, é comum depararmo-nos com um ritual chamado “culto da fogueira”. Quem nunca participou de um, não é mesmo? Esse ritual tem o objetivo psicológico de “queimar”, por assim dizer, os nossos pecados cometidos. Não ouso negar sua eficácia emocional, pois eu mesmo já “senti” que meus pecados foram expurgados na hora em que o bendito papel estava sendo queimado. Que momento psicologicamente maravilhoso e emocionante.  Além do “culto da fogueira”, recentemente me deparei também com o ritual “oração a Deus por meio do balão de gás”. A questão era simples: deveríamos escrever nossos pedidos de oração numa pequena folha de papel e colocar dentro de um balão, que seria inflado com gás e subiria “aos céus”. Não duvido que muitos, vendo aquele balão subindo até sumir da vista, sentem que suas orações chegam lá. Que estratégia emocional e psicológica magnífica! Bem, qual é o problema disso tudo? Tudo.  Assi

DA SÉRIE: LOUVORES HERÉTICOS - LINDO ÉS

Existem algumas músicas que falam do desejo de humilhação de quem canta. Geralmente é assim: "Eu quero me humilhar diante de Ti Senhor", ou algo parecido. O grande problema é que o pressuposto desse clamor é um estado natural de exaltação, o que é um equívoco ao se tratar de um ser humano. O único que de fato se humilhou aqui na terra foi Jesus Cristo. Quando Paulo fala em Filipenses que Ele se esvaziou de sua glória e se humilhou, em outras palavras o apóstolo está dizendo apenas uma coisa: ELE SE TORNOU HOMEM! Cristo não deixou os seus atributos divinos justamente porque ele continua sendo 100% Deus; o humilhar-se dele é o SER UM DE NÓS, HUMANO! O ponto é que ser humano já é um estado de humilhação! Já somos por natureza humilhados. Então, meu amigo querido, não existe a opção "quero me humilhar", a não ser que você seja Deus, o que não é o caso. O que existe é: "eu reconheço meu estado triste de humilhação!" Uma boa canção exige uma do